O paisagista

 Afinal de contas, qual é sua função?

Roberto Burle Marx: um dos maiores paisagistas do século XX

Há milênios que o mundo se organiza procurando o bem estar destes pobres terrícolas que nele habitam. Inventamos a roda, Prometeu roubou o fogo dos deuses, criamos o calendário, vasculhamos todos os mares e descobrimos a América. Entretanto ainda não achamos o verdadeiro sentido da vida, apesar do filósofo Platão, de Arjuna, o herói do Mahabharata e dos esforços de Sigmund Freud e de seus seguidores.

Os médicos cuidam das pessoas para que possam viver mais e com saúde, arquitetos se preocupam com moradias confortáveis e os advogados administram a justiça nos salvando (pelo menos tentam) dos iníquos. Mas e os paisagistas? Qual é a utilidade deles, se a paisagem já existia antes mesmo de Adão e de Eva? De quem foi a ideia de mexer com a natureza na tentativa de colocar ordem na sua flora? Ora, isto parece de uma presunção e de uma arrogância colossal. Reagrupar árvores, fazer cercas-vivas, revestir muros com trepadeiras, plantar flores em canteiros, seria isto uma interferência na espontaneidade das coisas, deste espaço físico que nos rodeia?

A resposta é complexa, mas creio que há um atenuante que pode justificar a mania de misturar plantas, criando cenários que aparentem aspectos atrativos ao nosso olhar. A partir do momento em que as tribos primitivas começaram a se relacionar entre elas, iniciou-se uma troca de objetos manufaturados e de plantas comestíveis e medicinais. As sociedades se organizaram e comunicavam-se entre si cobiçando o que os seus vizinhos tinham. Importavam elementos concretos e práticos, mas não descuidavam de fatores religiosos, poéticos e/ou estéticos, copiando e adequando símbolos de outras culturas ou adaptando maneiras de contemplar as coisas.

É aí que o paisagista surgia, ajustando a flora nativa com as espécies que os conquistadores e mercadores viajantes lhe traziam de terras distantes. Mais tarde, os fatores religiosos e reinos poderosos foram decisivos para a arte de organizar os jardins. Isto é evidente nos horti neroniani (os jardins de Nero), nos jardins de Livia Drusilla, esposa do Imperador Augusto, no incrível paraíso fabricado pelos jardineiros de Kublai Khan ou, mais recentemente, em Cleveland o “Rockefeller Park”, um parque com jardins paisagísticos dedicado à várias nações.

Creio que possuímos elementos que legitimam aqueles que tentam inventar novas paisagens; porém não desculpo os que alteram o âmago da composição florística brasileira, introduzindo princípios exóticos e extravagantes. Enriquecer nosso olhar com o belo merece nosso aplauso, mas enxovalhar o que já é generoso e harmônico precisa levar vaia!

Autor: Raul Cânovas

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