Enfim, o virtuoso

 Há de tudo na floresta, mas cada indivíduo trava uma luta diária para sobreviver

 Sumaúma (Ceiba pentandra)

Na mata fechada vivem representantes dos mais variados do mundo vegetal, desde tímidos musgos até majestosas árvores, sem esquecer as trepadeiras que, sempre folgadas, se aproveitam de algum tronco próximo para, apoiadas nele, subir em busca da luz do sol. Há também as graciosas palmeiras, sempre tão orgulhosas, e as bromélias e orquídeas que apoiadas nos ramos se mostram iguais a vedetes exibidas. 

É interessante comprovar que quanto mais propício o ambiente, maiores são as colônias de plantas dos mais variados tipos. Ao contrário do planalto siberiano no Norte da Ásia, onde ficam agrupadas apenas as florestas de pinheiros, nas regiões próximas à linha do Equador se desenvolvem diversas espécies, graças à umidade e temperaturas altas e, no caso dos vales, à fertilidade elevada de seus solos.

Mas exatamente por isto é que, devido à densidade enorme de espécies, o esforço pela sobrevivência é maior. Talvez pudéssemos comparar essas comunidades biológicas com bairros, como Copacabana, no Rio, onde mais de 36.000 pessoas vivem por quilômetro quadrado, segundo dados do IBGE, usufruindo das benesses da “princesinha do mar”. Cidades com temperaturas muito baixas, longe de praias convidativas, são pouco habitadas, como é o caso de Montreal, Copenhague ou Helsinki, muito embora ofereçam padrões de vida considerados altos, se comparados ao resto do mundo.

 

Nessas selvas tropicais há uma árvore que se destaca, não apenas pelo tamanho, mas também pelo caráter. É a sumaúma (Ceiba pentandra) que vegeta desde o México até a Amazônia brasileira, e também na Guiné Equatorial, Angola, Filipinas, Indonésia e outros territórios com climas excessivamente quentes e úmidos. Essa espécie alcança quase 70 metros de altura, apoiada em um tronco cuja base possui várias raízes tabulares. Pelo tamanho poderia exercer um poder quase despótico sobre a vegetação vizinha e, sem embargo, em lugar de cometer abusos, se preocupa oferecendo sombra às pequenas samambaias e proteção e sabedoria às pequenas árvores que nascem em sua volta.

Lembro ter contemplado, no Pará, uma imensa, que parecia vigilante no meio de um espesso arvoredo. O lugar era bucólico e totalmente selvagem, tendo-me obrigado a andar por mais de duas horas a pé, depois de um longo tempo de barquinho por um curso de água afluente do Rio Guamá. Apesar de agreste, esse espaço tinha algo de civilidade. Percebi que ela, a sumaúma, governava de modo delicado e virtuoso um pedaço de mundo, isento de depravações ou qualquer outra forma de corrupção.

Voltei à civilização, duvidando um pouco sobre o conceito da cultura social que as grandes cidades nos proporcionam.

Autor: Raul Cânovas

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