Cercas vivas

Não gosto de cercas vivas, particularmente daquelas com linhas retas, podadas ao extremo

A paisagem fabricada deve guardar, intrinsecamente, a espontaneidade e exuberância dos espaços silvestres. É claro que não falo de uma agrestidade exagerada, mas sim da livre sinuosidade que o jardim bucólico deve ter, para poder “conversar” com o vento e atrair ingenuamente uma boana de borboletas. Sem querer, de modo inconsciente, o habitante das grandes cidades tem se afastado do aspecto salutar que a vida campestre oferece: ar puro, horários flexíveis, comidinha caseira e aquela prosa no final de tarde com os amigos verdadeiros.


Planta baixa (desenho de Raul Cânovas)


Vista (desenho de Raul Cânovas)

Sempre digo que a função essencial de meu trabalho, como paisagista, é poder devolver um pouco da felicidade perdida à aqueles que optaram por uma vida cosmopolita, isto é, uma existência um tanto pasteurizada que os levou ao esquecimento das tradições ancestrais, daquele pedaço de terra onde cresceram. Fico aflito ao ver jardins emoldurados por verdadeiros tapumes verdes, como querendo repetir os contornos da cidade, sempre retos e agudos, portanto, frios e sem sensualidade alguma.

O jardim nos dá a possibilidade de ter contato com a natureza, isto é, com tudo aquilo que tem como característica fundamental o fato de ser genuíno e natural. Por isso deve ser o resultado de uma imagem que sintetize os elementos existentes em um grande território: as formas, os volumes, as tonalidades de verdes e, também, os cheiros, os sons, os sabores e a sensação incrível de passar a mão em um tronco coberto pelos musgos.

Uma alternativa à sebe retilínea e sem graça é o renque irregular onde árvores e arbustos se harmonizam de maneira assimétrica, dando do mesmo modo uma proteção visual mas, reproduzindo de certa forma uma paisagem sem artifícios .

Precisamos cada vez mais de autenticidade. Uma das coisas mais ridículas é o jardim postiço, é a cerca viva rigorosamente podada e artificial, anulando as promessas de crescimento que as plantas carregam.

Os desenhos mostram, em escala 1:250, como conciliar espécies, criando um renque natural. Nele há árvores, arbustos de grande porte e outros menores que, próximos uns dos outros, compõem uma paisagem construída, porém, nada artificial.

Autor: Raul Cânovas

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