O bom gosto

 A sutileza apurada pelo refinamento se contrapõe com a vulgaridade. Como separar um do outro?

Aos poucos, o mundo supera suas divisões e seus preconceitos. A distância entre ricos e pobres é cada vez mais curta; Ocidente e Oriente mesclam experiências e crenças; líderes negros se destacam e a saúde sexual passa a ser mais importante do que as opções de prazer entre pessoas.

Penso que, superadas tantas diferenças, permanecerá por muito tempo a desproporção entre o bom gosto e a estética torpe. A possibilidade de maior acesso ao design permite que a chamada classe C, ou Classe Trabalhadora, que inclui os chamados "profissionais de colarinho-azul", adquiram móveis, eletrodomésticos, utensílios, roupa e carros, com uma concepção e uma elaboração que ninguém sonhava nos anos 70. Percebo que, as profissões de design de interiores, design de moda e design de produto se popularizaram de modo tal que ja não é necessário frequentar os cursos do Instituto Europeo di Design em Milão; os de moda em Paris, nem ir à Alemanha para ficar um tempão na Bauhaus, aprendendo com as experiencias de uma escola fundada por Walter Gropius em 1919. Sem sair do Brasil, mas com muito esforço, sem dúvida, é possivel que filhos de uma elite não dominante se graduem nestas áreas e ditem, atualmente, tendências que todo o mundo segue.

Visto assim parece fácil, de repente o bom gosto pode ser comprado em um shopping. Será? Creio que não, porque a elegância não é uma mercadoria que adquirimos com dinheiro, se assim fosse os endinheirados seriam chiquérrimos e aqueles que não tem esse privilégio teriam "uma maneira de ser" inclinada ao escasso valor estético, sem nenhum envolvimento com o belo. Como podemos constatar, essa regra não pode ser utilizada com frequência e, apesar da maior possibilidade de escolha e de informação que as pessoas da classe A tem, o kitsch é muito comum entre os mais abastados e não é raro de ver a elegância natural que é praticada por pessoas que ainda padecem com a desigualdade social.

O jardim, como sempre, tem algo de emblemático. Funciona na maioria das vezes como uma espécie de brasão que pretende identificar, de modo heráldico, o clã ao qual pertencemos. Compondo as fachadas de algumas residências, vemos plantas caríssimas espalhadas sem harmonia nem sintonia, pinheirinhos e palmeirinhas convivem irmanando o tropical com o frio da montanha. Embaralhados, buxinhos escravizados pela poda sobrevivem com orquídeas asiáticas, libertas nas copas das árvores. Todo pelo artifícioso afã de mostrar que, nessa casa, alguém com recursos exibe seu poderio.

Cuidado, é bom inspirar-se em Lord Brummel, o elegante amigo do Príncipe de Gales (futuro Rei George IV) que, no inicio do século XIX, impôs à moda discreta dos ternos escuros e os foulards que usava como gravatas. Discreto, quase modesto para a sua época, pedia a seu criado que desse brilho a suas botas com champagne. Segundo ele, a melhor forma de ser chique era não chamando a atenção, mas ser admirado pelo bom gosto.

Enfim, lições de um homem conhecido como “O Belo Brummel”.

Autor: Raul Cânovas

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